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O perigoso efeito crowding-out que se aproxima

Jhonatan Ribeiro

16 de jan. de 2023

Você que acompanha o Agropills sabe que nosso compromisso está sempre alicerçado em tratar questões econômicas de forma compreensível, feita para entender. Resumindo: simples sem ser simplista.


Assim sendo, começamos a Newsletter pedindo desculpas pela expressão que possivelmente não te remete a nada, a não ser que você tenha algum conhecimento de economia. Mas ela sumariza algo muito complicado que deve acontecer nos próximos anos.


Dentre as diferentes atuações possíveis que governos podem ter, uma delas é a realização direta de investimentos. Sempre que isso é colocado em prática, a justificativa apresentada pelo governo da ocasião é a de estar preenchendo uma lacuna que ficaria em aberto sem tal atuação, tendo em vista que o setor privado não teve interesse, até então, de tomar esse risco.


Em certos cenários isso de fato é verdadeiro, tendo em vista que o setor privado não apresenta interesse por incursões que não envolvam retornos positivos e, com essa não possibilidade de lucros que remunerem a incursão, ou o Estado acaba por agir ou aquele investimento acaba não sendo realizado.


Porém, existe sempre o risco de que isso seja um discurso vazio de quem deseja ampliar a presença pública nos investimentos sem real necessidade. Quando olhamos para a economia, o risco trazido por esse tipo de atitude por parte de um governo – a de aumentar sua participação nos investimentos realizados sem que isso de fato seja uma necessidade –  é o de acontecer o chamado efeito crowding-out.


Esse efeito, de maneira direta, significa que o governo entra no jogo e, mais do que proporcionalmente, os entes privados saem desse mesmo espaço – tornando o agregado de investimentos desfavorável.


A história no Brasil se repete (e rima)


Momentos de dificuldade suscitam atitudes que venham a aliviar o cenário adverso. Isso pode parecer frase feita, mas é importante quando estamos falando da gestão econômica de um país, tanto em termos de impressão popular passada pelo governante da ocasião quanto pelos resultados práticos de alívio econômico que podem ser gerados.


Essas medidas, se seguidas de maneira adequada com o objetivo de aliviarem questões de curto prazo – já que nenhuma crise é eterna -, são chamadas de medidas anti-cíclicas, porque suavizam o momento do ciclo econômico em que vemos uma redução da atividade que poderia ser muito mais danosa sem tal atuação.


O problema no Brasil está no fato de que, por aqui, nenhum governante gosta de dar más notícias, então os ajustes que precisariam vir juntamente das benesses que promovem alívio em momentos de dificuldade simplesmente não acontecem. Para citar três ocasiões diretas disso apenas dos anos 1970 para cá, no pós Milagre Brasileiro, durante o Plano Cruzado e nas medidas pós-crise de 2008 em Lula II e Dilma I tivemos a mesma concepção de ampliar gastos e/ou a presença do Estado de maneira pontual virando algo muito mais esticado do que seria necessário.


Especificamente nos períodos de Geisel e Dilma, tivemos a continuidade de investimentos e intervenções setoriais, marcadas no primeiro pela ampliação de obras públicas e empresas estatais e na segunda pela concessão de empréstimos subsidiados direcionados e desonerações setoriais elevadas, que demonstraram em termos práticos a dificuldade ambidestra de governantes em dizer que “infelizmente precisaremos fazer ajustes”.


O problema não está na presença ou ausência de subsídios por parte do governo de quem quer que seja, mas de como acabam sendo executados. Todas as vezes em que as boas intenções cegam a análise crítica de necessidades, as possibilidades de que grupos produtivos organizados roubem excedente da sociedade – e, no limiar, via meios corruptos – aumentam.

Isso vai muito além dos próprios desembolsos realizados, inclusive.


O próximo provável capítulo: Lula III


O que esses dois casos (Geisel e Dilma) têm em comum com o que possivelmente iremos observar em Lula III? A intenção positiva anunciada de recuperação de capacidade produtiva com meio de maciços investimentos/desembolsos públicos sem análise real de custo de oportunidade que, no final das contas, irão custar caro ao país e trazer poucos retornos reais – sequer a quem se beneficiar de tais benesses diretamente.


Desde a campanha, em muitas ocasiões Lula se posicionou a favor de uma certa “volta do Estado como sendo indutor de crescimento econômico”. Isso se baseia em uma arraigada crença colocada por diversos governantes, à direita e à esquerda, de que bastaria aumentar investimentos públicos para que o desenvolvimento econômico venha a ocorrer logo depois.


Na prática, independente dos meios e intenções pelos quais esse tipo de política é executada, geralmente por não ter acompanhamento de eficiência, estudo de necessidade real e nem porta de saída (o literal “se não der certo vamos cortar”), ocasiões como essa abrem alas para que grupos de interesse do setor produtivo exerçam pressão para conseguir benefícios mais fáceis, diretos e exclusivos.


Lembrando do caso das Campeãs Nacionais do BNDES, por exemplo, tivemos várias empresas que já tinham acesso ao mercado de capitais que, por terem sido elencadas como “de potencial internacionalizável”, tinham acesso a recursos subsidiados para tocarem suas atividades.


Ainda em Lula II, conforme essa política se desenvolvia, já tínhamos pesquisadores como Mansueto Almeida apontando os perigos e limitações dessas ideias. Já no início de Dilma II também tínhamos pesquisas que se debruçaram sobre os danosos resultados desse conjunto de ideias.


E onde entra o efeito crowding-out nisso tudo?


Em todos os exemplos elencados aqui de intervenções diretas (por meio de estatais) ou indiretas (via financiamento) do setor público no campo dos investimentos, temos que o incentivo gerado para os entes privados é de que não haveria necessidade de interagir se colocar presente tomando aquele risco.


O maior problema disso é que, diferentemente do que se imagina, a troca entre participação pública e privada nos investimentos não ocorre na mesma proporção, como se um passasse o bastão para o outro. Geralmente, com o ampliar da participação pública (ou mesmo do anúncio de grandes intenções dessa direção), a participação privada se reduz de maneira mais veloz.


A possibilidade perigosa com a qual nos deparamos nos próximos anos está no fato de que, diante da já anunciada elevação de investimentos públicos e redução nos que se objetivam ocorrer por vias privadas – o que é englobado por direcionamentos de paralisação de processos de privatização, por exemplo -, o desaquecimento da demanda privada por esse tipo de ação deverá se refletir em uma queda notável da proporção de investimentos.


Cabe apontar que, diferentemente do que é proposto por essa teoria secular brasileira de que seja necessário aumentar investimentos públicos para motivar a conta total de investimentos, mesmo no primeiro trimestre de 2022 termos o menor nível de investimentos públicos desde 2003 (1,61%), temos neste ano o maior nível de investimento em relação ao PIB desde 2011.


Concessões na infraestrutura e privatizações de estatais saem do radar, entram as possibilidades de que políticas já testadas e fracassadas em outros momentos (embora carregada de belas intenções) voltem para o campo de visualização.


Que tenhamos consciência desde já que, tal qual disse recentemente André Esteves em evento do RenovaBR, “qualquer 0,5% de entrada do setor público no investimento poderá significar uma queda de 5% do agregado pela saída do investidor privado”.


Crowding-out é a notícia indesejada de um amanhã certo caso o que se anuncia como sendo a nova (na verdade bem velha) bola da vez realmente vire realidade.


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